Retrofit faz galpões e fábricas antigas mudarem a logística urbana
Simone Santos*
Durante a primeira década dos anos 2000, a capital paulista, motivada pelo novo plano diretor e linhas de crédito e financiamento imobiliário, passou por um importante processo de transformação. Seus bairros industriais começaram a trilhar processo de metamorfose – faça um passeio pela linha do tempo do Google Earth, nos bairros da Mooca, Barra Funda e Santo Amaro, e perceberá as antigas fábricas sendo ocupadas por espigões residenciais.
Nessa época, abriu-se uma oportunidade para as indústrias venderem seus imóveis, saírem dos conflitos da grande cidade e migrarem para o Interior, em instalações mais modernas e baratas. Parecia um fluxo sem volta.
Contudo, o advento “e-commerce” fura esse fluxo, e há exatos 4 anos, acompanhamos o mercado imobiliário olhando para os galpões antigos, não só para a incorporação residencial, mas para acomodar a nova tendência: demanda de espaço na capital, para suprir a logística urbana.
Mas a cidade ainda oferece esse tipo de ocupação? A tese para preservar os galpões da cidade é viável? Sim, mas com muitos desafios.
A começar pelo custo. A viabilidade financeira é a maior de todos, já que compete diretamente com as incorporações residenciais, que verticalizam e conseguem extrair maior potencial dos terrenos, enquanto os galpões obtêm suas receitas na ocupação horizontal. Para diminuir essa competitividade, enquanto a incorporação leva anos para saldar o vendedor, o galpão paga no curto prazo.
Mas os desafios a serem superados vão além: restrições de zoneamento, conflitos de vizinhança, solos contaminados, documentações irregulares, morosidade nas aprovações municipais, etc, etc.
Superado tudo isso e colocado o galpão para locação, o potencial de absorção é enorme, já que cada vez menos teremos esse tipo de imóvel na cidade, ao mesmo tempo que o e-commerce e a urgência da entrega, só crescem.
Importante destacar que São Paulo, uma das maiores metrópoles do mundo, é abastecida 24 horas por dia. Quando minha mãe era criança, o padeiro entregava o leite e a bengala, todos os dias de carroça. Meu filho deverá receber em breve suas encomendas por drone. Mas o fato é que a logística urbana sempre existiu, nunca vai parar e estará sempre em transformação, buscando qualidade, agilidade e sustentabilidade.
É fácil perceber que a demanda por galpões urbanos sempre existiu, mas foi pouco vislumbrada pelos desenvolvedores de galpões, que somente agora foram despertados pelo e-commerce – e pela tão falada “last mile”. Importante: quem já está nesse mercado sabe que o potencial de ocupação vai muito além do comércio eletrônico.
Há um mercado gigantesco para o famoso “fly to quality”, que busca não apenas melhoria na área construída, mas também na relação com o proprietário, e, principalmente, na documentação do imóvel, evitando problemas com licenças e alvarás, muito comuns e corriqueiros nos galpões mais antigos.
Por conta dos longos prazos para aprovação de novos projetos pela Prefeitura de SP, no mínimo 3 anos, é quase impossível viabilizar um empreendimento de galpões do zero – por isso, o caminho mais aderente tem sido o retrofit de antigas fábricas. Com algumas exceções, os galpões urbanos devem continuar crescendo por esse caminho, já que o retrofit sem demolições e ampliações, permite uma ocupação mais rápida, em torno de 12 meses.
A capital paulista representa hoje 3,51% do estoque total do Brasil, com 843.000 m², dos quais 40% foram ‘retrofitados’ para atender esse perfil de ocupação. O valor médio de locação dos empreendimentos é de R$ 36,56/m² (contra R$ 23,72/m² da média nacional), com taxa de vacância de 13,30%. A previsão é que novos 520.000 m² sejam entregues até o final de 2024, dos quais 30% localizados no Centro expandido, e o restante nas extremidades da cidade.